Régis acorda as 6:30 da manhã, ele dorme mal já faz muito tempo. Olha pela janela do quarto, o dia está cinzento como sempre. Esse tempo nunca ajuda. Se senta na lateral da cama, se sentindo acorrentado a ela. Toma os seus remédios matinais. "Não fazem mais efeito", ele pensa. Se levanta vagarosamente enquanto passa a mão na cara, barba comprida já faz dias. Não conseguia se lembrar da última vez que tinha ficado verdadeiramente feliz, o máximo que chegava era uma puxada de bochecha aqui ou ali, que não chegava a ser um sorriso.
Olha para seu lado, sua esposa está no outro lado da cama, de costas para ele, abraçada no travesseiro. "Deixe-a dormir, hoje deve ser seu dia de folga" ele reflete. Se veste e então se dirige para a cozinha, também sem pressa. Então consegue escutar passos na escada, olha para trás e reconhece seu filho. Arthur, 6 anos, tinha olhos claros, como a mãe, os cabelos castanhos, uma cara redonda, apesar de ser muito magro.
O menino fala, ainda sonolento:
"Papai, você já vai sair de novo? Eu estou com saudade"
"O papai precisa ir filho, você ficará bem com a sua mãe"
"Ela também sente saudade. Ela me diz sempre"
Régis então dá um beijo na cabeça do seu pequeno filho e diz após um longo suspiro:
"O papai tem que voar filho"
"Como é papai? Voar?"
"Um dia você saberá filho"
Então eles se abraçam, o pequeno Arthur se dirige de volta para a cama. Régis fita seu filho subindo as escadas. "Como estava crescido, quando foi que ele ficou parecendo um homenzinho?".
Olhando para a cozinha, tão limpa, arrumada. A pia era de granito negro, ele se lembra quando escolheu-a para a cozinha. A pia contrastava com sua pele, excessivamente branca. Ele então percebe que não está com fome, nem sede. Olha para o relógio da cozinha, 7:00 horas. É hora de sair.
Mesmo assim, ele passa no quarto de Vânia, sua esposa, lhe dá um beijo na bochecha que é retribuído com um gemido grave e sonolento. Logo depois passa no quarto de Arthur e dá o mesmo beijo que dera em Vânia. O garoto abre os olhos devagar e diz baixinho:
"Eu te amo pai"
"Eu também te amo filho, cuide bem da sua mãe"
O menino fecha os olhos, quando os abre, alguns segundos, depois seu pai não estava mais no quarto. Uma lágrima solitária sai do canto do olho do menino, após poucos minutos de reflexão, ele corre escadas a baixo, torcendo para ver seu pai sentado na poltrona como antigamente. Tarde demais, seu pai já tinha partido.
Alguns poucos minutos depois Régis chegava ao aeroporto para mais uma viajem, sua escala mostrava: Brasil-Portugal, Portugal-Alemanha, Alemanha-China, China-EUA. Só veria sua família depois de duas semanas no mínimo. Depois que começou a trabalhar nas linhas internacionais da empresa aérea - por mais que ele ganhasse mais do que nas linhas nacionais -, Régis se sentia mal, se sentia preso, se sentia morto.



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